Os desafios da ATER Remota após dez meses de pandemia

Por Helena Dias
Com a chegada da pandemia no Brasil e as restrições de contato social em março de 2020, os processos de Assessoria Técnica e Extensão Rural (ATER) passaram por significativas transformações para continuar acontecendo. O que antes era feito presencialmente se tornou uma rotina de whatsapp e outras redes sociais, compondo uma prática que não é novidade mas tomou conta do período pandêmico, prática chamada de ATER Remota.

Assim como o nome já diz, a ATER passou a acontecer remotamente. Técnicos e famílias agricultoras tiveram que se adaptar ao distanciamento social, às medidas de prevenção contra o novo coronavírus e às tecnologias que pouco eram usadas em suas casas.

“O primeiro passo que a gente deu foi formar grupos de produção, a gente formou grupos no whatsapp para ficar circulando informações”, conta o técnico do CAATINGA, Allexandre Holanda.

A iniciativa culminou na formação de vários núcleos de famílias assessoradas pelo CAATINGA. Ao todo, são cerca de 400 famílias no Projeto Algodão e Consórcios Agroecológicos e esses núcleos estão localizados em todo Sertão do Araripe. “Tem um núcleo de Ouricuri e Bodocó e um outro núcleo só com o município de Parnamirim, porque tem um número de seis grupos de produção formados. E o outro núcleo é em Santa Cruz e Santa Filomena”, explica Allexandre.

Após um tempo de pandemia, quando as recomendações de segurança em saúde já estavam estabelecidas, o CAATINGA voltou a fazer algumas visitas técnicas, mas em uma frequência bem menor que a habitual. As dúvidas e informações rotineiras são tiradas e compartilhadas ainda pelo whatsapp.

“Lembro que estava com problemas de pragas no tomate e me orientaram sobre o uso da calda das cinzas. Fiz e deu muito certo”, afirma a agricultora Francisca Fabiana, do município de Santa Filomena. Ela é assessorada na ATER Remota.

Apesar do positivo relato da agricultora, o fácil acesso à internet não é uma realidade na maioria das famílias. A técnica do CAATINGA, Marizete Brasilina, acompanha 37 famílias na comunidade do Minador, também em Santa Filomena. Segundo ela, “algumas famílias não têm telefone celular e nem internet de boa qualidade”.

O diálogo de fato ativo se mantém com aquelas que possuem sinais de internet mais estáveis e conseguem ter o acompanhamento de suas atividades econômicas e agrícolas. Enquanto as famílias têm dificuldade de acesso, os técnicos somavam esta questão com a necessidade de se capacitar para usar cada vez melhor as plataformas digitais em prol da prática de ATER. “Somos capacitados por meio de salas online e videoconferências”, acrescenta Marizete.

Assim como ela, a agrônoma e técnica do CAATINGA, Zuleide Izídio, destaca que há muitas dificuldades nos processos remotos, mas que também existem pontos positivos.

“Além de estar mantendo esse contato, teve algo bom que foi poder orientar elas tanto no sentido da prevenção contra a Covid-19 como sobre as políticas públicas que estavam sendo disponibilizadas na pandemia. Foi um momento de aprendizado tanto para nós da equipe técnica do CAATINGA quanto para as famílias agricultoras”, destaca Zuleide.

O antropólogo e colaborador do CAATINGA na área de mobilização de recursos, Omar Rocha, avalia positivamente a experiência da ATER Remota durante o período pandêmico e lembra que essa prática não surgiu com a pandemia. “Nos últimos anos têm se desenvolvido novas formas de acesso à internet que são especialmente as do whatsapp e e-mail”.

Para além do aprendizado sobre o uso das plataformas digitais, Omar vê a ATER Remota como uma prática “emancipatória” que está atenta às demandas das juventudes e das mulheres do meio rural.

Estes e muitos outros processos de ATER Remota vêm sendo estudados numa parceria do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA), institutos governamentais e ONGs. De acordo com o coordenador geral do CAATINGA, Paulo Pedro de Carvalho, o FIDA estabeleceu uma relação com o IPA EMATER e EMATERCE. Também com o CAATINGA, CETRA e SASOP. As experiências observadas não são apenas do Brasil, mas também da Colômbia e de Moçambique por meio da Fundacíon Capital e do Ministério da Agricultura, respectivamente.

“Podemos entender que é importante trabalhar melhor o acesso à internet de qualidade para viabilizar a ATER Remota, tanto para as famílias quanto para os técnicos. E também capacitar os técnicos de ATER das instituições públicas e ONGs e famílias para o uso dos equipamentos e no acesso à internet”, diz Paulo.

Por meio dos estudos, foi possível compreender que a ATER Remota não substitui a presencia. Ambas de complementam e são serviços que precisam ser institucionalizados, considerando as possibilidades de atividades virtuais com condições para que as equipes consigam executar.

Você pode conferir os relatos deste texto na íntegra do programa Agricultura Familiar em Debate, do CAATINGA. Este programa foi veiculado nos dias 9 e 10 de janeiro de 2021. Acesse: https://bit.ly/progcaatinga09012021

 

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