A luta pela agroecologia também é uma luta antirracista

No mês da Consciência Negra, precisamos perceber como o racismo também atua no campo
A família de Maria Diva vive no Sítio Boa Fortuna, zona rural de Ouricuri (PE) / Foto: Cáritas Suíça/Luca Zanetti

Por Ana Roberta Amorim – Angola Comunicação/CAATINGA

Ao pensar sobre a população preta brasileira e todo o contexto racista trazido na história do país, uma das primeiras coisas que podem vir à mente são as lutas ocorridas nos ambientes urbanos: movimentos nos centros e nas periferias. No entanto, assim como em vários aspectos, o ambiente rural reflete muitas das problemáticas existentes nas regiões metropolitanas. E com o racismo não é diferente. 

Em novembro, quando é comemorado o Dia da Consciência Negra, é preciso lembrar que falar sobre agroecologia e agricultura familiar também é falar sobre antirracismo. De acordo com o Censo Agropecuário de 2019, a maioria dos produtores rurais do país são negros. Em números absolutos, há 2,6 milhões de negros e 2,2 milhões de brancos. 

No entanto, quando o contexto é observado, é possível perceber as heranças históricas presentes até hoje. Os negros produtores rurais são maioria apenas nas terras com menos de 5 hectares. A partir desse número e, principalmente, de 20 hectares para cima, os brancos são maioria absoluta. Ou seja, aos produtores pretos é permitido apenas o acesso a terras menores e, consequentemente, os grandes produtores, donos do agronegócio do país, são os latifundiários brancos. 

Isso não é por acaso. Quando a Lei Áurea foi assinada, há mais de 130 anos, não houve qualquer tipo de projeto de integração da população negra recém-liberta no que diz respeito ao trabalho, moradia ou outro direito básico do qual qualquer ser humano precisa ter acesso para viver de forma sustentável. E isso vale para a cidade e também para o campo. Se as periferias ou favelas foram formadas a partir desses grupos excluídos da sociedade, a negação às negras e aos negros dos grandes hectares de terra também aconteceu e se reflete até hoje. 

Também não é possível esquecer da herança cultural e social dos quilombos, formados em sua maioria longe dos centros urbanos, pelos quais nasceram as lutas de resistência antirracistas espalhadas pelo país. Até 2019, no entanto, apenas 124 comunidades quilombolas tinham os títulos das suas terras assegurados – sendo que mais de 1700 estavam com pedidos em aberto, a maioria na região Nordeste. Não reconhecer e negar o título dessas terras é também ignorar a existência das pessoas que ali vivem e produzem. 

Não é por acaso, portanto, que a agroecologia tem como referência a imagem de pessoas pretas, como Margarida Alves, o grande símbolo de luta contra a violência contra a mulher, o sistema patriarcal e o racismo, e que dá nome às Marchas das Margaridas. 

Lutar por uma agricultura familiar, sustentável, é também é uma luta antirracista!

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